sexta-feira, novembro 02, 2007

Bloco 5 - Contos de Fadas - Versão Final

1. Qual a relação que se pode estabelecer entre autoria individual e os Contos de Fada?

Segundo Abramovich, “os contos de fadas são vividos por meio da fantasia, do imaginário, com intervenção de entidades fantásticas – bruxas, fadas, duendes, animais e plantas falantes...” Notadamente, a grande maioria dos contos de fadas são criações populares, perpetuados de geração em geração, posteriormente compilados por alguns grande autores, como o francês Charles Perrault e os Irmãos Grimm. Outro nome famoso, e que constitui a tráide dos contos de fada, é do dinamarquês Hans Christian Andersen o qual, diferentemente dos primeiros, não limitou-se a compilar e difundir contos da tradição oral de um povo, mas criou histórias completamente novas, ainda que seguindo a estrutura dos contos conhecidos. Andersen passou a ser considerado por muitos como o pai da literatura infantil.

O dinamarquês provocou a imaginação de outros autores. De acordo com Ana Maria Machado, “a partir daí, pela primeira vez, algumas obras começaram a ser criadas es­pecialmente para a leitura infantil, sem intenção didática. Por outro lado, grandes escritores consagrados em outros gêneros também se aventuraram a desafiar os preconceitos e fazer incursões criativas pelos contos de fadas — como o inglês Oscar Wilde, por exemplo, que nos deu algumas obras-primas como O Rouxinol e a Rosa, O Príncipe Fe­liz e O Gigante Egoísta.”

Em um extremo oposto, percebe-se versões de autores individuais voltadas mais para a censura, o didatismo e o moralismo do que para o encantamento. Sem mostrarem-se sensíveis à literatura infantil, de forma arrogante ditam que suas versões vêm para corrigir equívocos cometidos pelas obras originais, ignorando que na literatura verdadeira reside muito mais do que um amontoado pretencioso de palavras.


2. De acordo com a autora, por que as pessoas contam histórias?

Primeiramente, a autora faz um resgate histórico, a um tempo no qual não existia a luz elétrica e a contação de histórias era o momento de reunião da família ao redor da chama de uma simples vela ou candelabro. Tais histórias, originalmente de tradição oral, estavam ligadas aos ritos daquela sociedade, prestando-se para, além do puro entretenimento, manter acesa a trajetória de uma sociedade.

Atualmente, dado que a humanidade desenvolveu a capacidade de controlar a intensidade da luz em qualquer momento do dia, parte da razão para se contar histórias perdeu-se. Contudo, ouvir histórias permanece como um momento mágico, no qual o ouvinte se permite acreditar, pelo tempo que a narração se desenvolve, que o cotidiano pode adquirir nuances diferentes da dura realidade estampada nas capas de jornais e alardeadas nos programas de rádio e televisão. Além de fomentar futuros leitores, as histórias nos possibilitam entender a vida pelo viés da fantasia, compreender nossa passagem pelo mundo, percebendo “na existência alguma espécie de lógica.”



3. Qual a posição da autora em relação às adaptações do Contos de Fada?

Não se pode esquecer que os tempos mudam e, com a passagem deste, os valores, as noções de moralidade e ética. O que era aceito décadas atrás, hoje pode parecer quase anacrônico. Por exemplo, em seriados de tv da década de 1960, era rotineiro e quase obrigatório que os personagens principais aparecessem fumando, pois acreditava-se que levar um cigarro aos lábios conferia uma certa elegância. Ao assistirmos à reprise de algum destes seriados – Agente 86, A Feiticeira, entre outros – não raro flagramo-nos surpresos com a naturalidade com que o tabaco desfila em um programa originalmente criado para um público infanto-juvenil. Ainda que a autora não cite os seriados, uso dos mesmos para traçar um paralelo com as adaptações já sofridas por alguns contos de fada. Enquanto no caso dos programas de televisão as mudanças foram fruto de uma adaptação à legislação vigente e à pressão da sociedade civil por tais alterações, autores que modificaram as histórias originais o fizeram por razões completamente distintas e questionáveis.

Para tais autores, as mulheres dos contos de fadas beiram à debilidade mental, pois não demosntram – ainda de acordo com eles – espírito de iniciativa, assumindo uma postura de passividade à espera de um príncipe encantado ou comendo uma maçã oferecida por uma completa estranha. Postulam ainda que matar o Lobo no final da história da Chapeuzinho é uma atitude cruel e totalmente reprovável. Ainda que atos que atentem contra a vida dos animais de nossa fauna, sejam estes domésticos ou selvagens, devam ser condenados, alterar ainda que um detalhe em uma história em favor do politicamente correto, do moralismo ou ainda de um didatismo explícito representam, segundo a autora, uma flagrante combinação de arrogância com ignorância.

Aquele que altera deliberadamente um conto esquece que estamos diante de uma obra da literatura mundial. A história alterada foi construída oralmente por pessoas do povo, muitas vezes humildes, que cometeram um ato poético de valor inestimável, guardando um bem cultural reconhecido e apreciado por incontáveis gerações. Apregoar razões ecológicas ou éticas é olhar de forma prepotente o leitor ou ouvinte, julgando que o mesmo não tem discernimento entre a fantasia e o cotidiano quanto ao que lê ou escuta. Para Ana Maria Machado, as adaptações de histórias ocorrem por mãos de ideólogos sem a menor sensibilidade para os contos, afirmando ainda que são fruto de pessoas de pouca leitura. Segundo Machado, “ não está cer­to que agora um candidato a autor ou pretenso pedagogo se invista unilateralmente do poder de modificar essa criação, e queira fazer crer a todas as gerações posteriores que é melhor do que eles.” Alterar um conto é descartar por completo seu sentido original, por vezes transformando a nova versão em algo esdrúxulo, desprovido de qualquer coerência, longe de ser sensato.


4. A partir da experiência docente, aponte como tem sido para você trabalhar com os Contos de Fada na sala de aula.

Assim como o teatro, percebo que a leitura e a contação de histórias aproximam o professor dos alunos, assim como os pequenos parecem estreitar laços a partir das mesmas, visto que experimentam um mesmo mundo fantástico e uma possibilidade de um cotidiano distinto nos momentos em que flertam com o imaginário.

Já utilizei os contos da forma que alguns autores apontam como equivocada, relacionando, por exemplo, a história da Formiguinha e A Neve com as estações do ano. Como acredito que se possa sim fazer uma relação entre a ficção e o cotidiano, apenas procuro não incorrer no erro de utilizar-me das histórias com o didatismo daqueles que postulam que todo conto deverá auxiliar algum tema de determinado componente curricular, como se a literatura não pudesse existir por si mesma.

As experiências a partir dos Contos de Fada foram inúmeras, ainda que apenas as mais gratificantes sejam aqui citadas:

  • Alunos dirigindo-se à biblioteca para retirar o livro com a história que o professor contou;

  • Existir lugar para o assombro e o encantamento ao ouvir/ler um conto já transformado em desenho animado, posto que as crianças percebem as diferenças existentes entre as linguagens cinematográfica e impressa, sendo que uma produção não anula a outra;

  • Notar que os alunos perderam o “medo” dos livros grandes, com muitas páginas, dado que estabelecem por si mesmos uma relação entre os contos e as sensações positivas, singulares e prazerosas que estes provocam;

  • Verificar uma melhora significativa na expressão escrita e oral dos alunos ao longo do ano letivo em função de uma sistemática de trabalho com contos de fada.


Referências Bibliográficas


Encantos para sempre, de Ana Maria Machado.